Por muito tempo, construir uma startup de tecnologia era sinônimo de levantar capital, montar uma equipe robusta de engenharia e escalar a operação o mais rápido possível. Hoje, esse modelo está sendo desafiado por uma nova força: inteligência artificial.
Durante uma entrevista à CNBC em março de 2025, Garry Tan, CEO da prestigiada aceleradora Y Combinator, revelou que 25% das startups atualmente aceleradas estão utilizando IA para gerar mais de 95% de seu código. Mais impressionante ainda foi a forma como ele interpretou esse movimento:
“Isso parece um pouco assustador, mas, por outro lado, o que isso significa para os fundadores é que você não precisa de uma equipe de 50 ou 100 engenheiros”, disse Tan, acrescentando que as empresas estão alcançando até US$ 10 milhões em receita com equipes de menos de 10 pessoas. “Você não precisa levantar tanto. O capital rende muito mais.”
Como disse Amy Webb durante o SXSW 2025: “O futuro vai acontecer, independente de quão desconfortável você esteja”.
As duas mensagens mostram que o jogo mudou.
A falsa sensação de autonomia total
Esse novo paradigma pode parecer libertador, mas levanta sérias preocupações.
Empreendedores podem se iludir achando que a IA vai resolver tudo. Desde o desenvolvimento ao produto final. Mas essa visão desconsidera pontos críticos como validação humana, arquitetura de software, escalabilidade e segurança.
Especialistas como Martin Reynolds, da plataforma Harness, alertam que o código gerado por IA exige revisão e depuração cuidadosas. Mesmo que 95% do código venha de ferramentas automatizadas, há uma camada invisível, mas essencial, que ainda depende de decisão humana. “O futuro da programação será sempre uma combinação entre criatividade humana e eficiência da IA.”
Além disso, engenheiros iniciantes ou recém-formados podem ver menos oportunidades no mercado, especialmente se as startups optarem por operar com times super enxutos e contratarem apenas especialistas para fases mais avançadas.
Antes, não dava. Agora, não tem mais desculpa.
Por muito tempo, quem estava começando um negócio de tecnologia esbarrava na falta de ferramentas acessíveis para tirar ideias do papel. Prototipar e testar soluções exigia tempo, dinheiro e uma equipe técnica. Ou seja, levantar capital parecia o primeiro passo obrigatório.
Mas esse cenário mudou.
Hoje, com ferramentas gratuitas e acessíveis baseadas em IA, é possível criar MVPs, testar hipóteses e validar produtos com um custo operacional mínimo. Não tem mais desculpa para achar que só apresentar uma ideia e um pitch bonito no PowerPoint é suficiente para captar novas rodadas. Investidor quer ver entrega, tração e consistência, mesmo que seja no estágio inicial.
E isso é ainda mais relevante num cenário onde os cheques em branco ficaram para trás. Em 2021, o Brasil viveu o pico da euforia, com R$ 51,3 bilhões captados em 551 rodadas de investimento e dez novos unicórnios surgindo só naquele ano. Mas os ventos mudaram. Em 2024, mesmo com uma leve recuperação (R$ 9 bilhões captados, alta de 17% em relação a 2023), o número de rodadas caiu 46%.
Ou seja: tem capital no mercado, mas a exigência subiu. Modelos de crescimento baseados em queima de caixa perderam espaço. Agora, o que importa é rentabilidade, eficiência e capacidade de execução.
O empreendedor do futuro é mais ágil, acessível e escalável
Apesar dos riscos, há também uma oportunidade única de democratização.
Para fundadores experientes, a IA permite “afinar” ideias, lançar produtos mínimos viáveis com rapidez e testar hipóteses de mercado de forma muito mais acessível.
Neste novo cenário, a barreira de entrada está caindo e isso pode abrir espaço para mais startups fundadas por pessoas fora dos grandes polos de inovação ou por profissionais que historicamente foram deixados de fora do ecossistema tech.
A verdade, como quase sempre, está no equilíbrio.
Sim, a IA está transformando a maneira como construímos software. Mas escrever código é apenas uma parte, e talvez a mais simples , de lançar um negócio de tecnologia com sucesso.
A IA ainda não substitui a capacidade humana de:
Definir uma arquitetura escalável;
Resolver problemas técnicos complexos;
Entender o comportamento dos usuários;
Traduzir tecnologia em impacto real de mercado.
As startups podem nascer enxutas, mas crescer com consistência, segurança e visão de longo prazo ainda depende de pessoas, e não apenas de máquinas.
O futuro das startups será moldado por quem souber usar a IA como extensão da sua criatividade e visão estratégica. Não se trata de eliminar equipes inteiras, mas sim de usar tecnologia para fazer mais, melhor e com propósito.
Startups que confundem eficiência com remoção do fator humano correm o risco de criar produtos frágeis, desconectados da realidade e sem futuro.
Como startups podem usar estratégia de marca para se manter relevantes na era da IA
1. Marcas fortes constroem confiança e confiança continua sendo a moeda mais valiosa
Segundo o Edelman Trust Barometer, as empresas são vistas como as instituições mais confiáveis, mais do que governos ou mídia. Em um mundo onde IA pode gerar produtos rapidamente, a confiança é o que diferencia uma marca real de um MVP esquecível.
Como aplicar: invista em posicionamento claro, comunicação transparente e relacionamento com comunidade. Mostre quem está por trás da tecnologia e por que isso importa.
2. Não basta eficiência, é preciso gerar conexão emocional
A pesquisa Sprout Social 2025 mostra que 93% dos consumidores esperam que marcas se conectem com a cultura online e ajam com humanidade nas redes sociais. No cenário atual, ser eficiente não é suficiente, é preciso ser relevante e relacionável. Além disso, 70% dos consumidores preferem comprar uma empresa onde os CEOs utilizam as redes sociais com mais frequência.
Como aplicar: crie uma estratégia de conteúdo que humanize sua startup. Use redes sociais para contar histórias reais, mostrar bastidores e trazer os fundadores e time para a linha de frente da narrativa.
3. Performance e branding não são opostos, são complementares
O estudo do SoftBank com a Suno mostrou que campanhas de performance também constroem marca quando bem executadas. O velho embate entre “branding de longo prazo” e “performance de curto prazo” já não faz mais sentido.
Como aplicar: use campanhas de mídia paga não apenas para conversão imediata, mas para reforçar os valores e a proposta da sua marca. Integre narrativa, produto e entrega.
4. IA resolve processos, mas a marca sustenta o negócio
Garry Tan, CEO da Y Combinator, afirmou que startups com menos de 10 pessoas estão alcançando milhões em receita com apoio da IA. Mas o código não é tudo: marca é o que permanece quando o hype passa.
Como aplicar: desde o primeiro MVP, defina um propósito claro, uma identidade visual consistente e uma narrativa que traduza a missão da startup. IA entrega velocidade, a marca entrega direção.
5. Em um mundo de startups “iguais”, diferencia quem tem clareza de posicionamento
A pesquisa da Kantar sobre crescimento de marcas mostra que marcas percebidas como significativamente diferentes têm até 5x mais penetração de mercado.
Como aplicar: não foque apenas em ser “mais um produto com IA”. Foque em como sua solução resolve um problema de maneira única, para uma comunidade real. Seja memorável.
6. A liderança de pensamento virou estratégia de posicionamento
O relatório da Edelman com LinkedIn mostrou que 89% dos tomadores de decisão consideram a liderança de pensamento um fator crítico para avaliar startups e fornecedores.
Como aplicar: os fundadores precisam aparecer. Produza artigos, vídeos e posts com opiniões, aprendizados e visões de futuro. Startups que educam o mercado conquistam autoridade e confiança.
Quem está fazendo isso bem: Dot e Hotina
Startups que dependem apenas de IA para entregar código e produto podem até começar rápido, mas só marcas bem posicionadas, humanas e confiáveis vão resistir ao tempo e escalar com consistência.
A IA é uma ponte.
A marca é o que sustenta a travessia.